Em Jeri, cumprindo prazos

Currículo: o seu currículo te define?

Estava eu concentrada em ajeitar meu currículo para mandar pra um punhado de empresas das quais me orgulharia em fazer parte do time, eis que me deparo com a seguinte informação sobre mim, escrita de próprio punho – o que é pior: Estado Civil: Solteira. Sem filhos. Assim, com letras maiúsculas.

CARA!@#!!!

Como eu era machista e nem me dava conta. Alô eleitores do Bolsonaro!!! 

Consigo até me lembrar de que achava vantagem colocar essas informações, principalmente a de que não teriam crianças para “atrapalhar” meu desempenho profissional. Me senti uma máquina. Me senti um troço a mercê do capitalismo e da ganância de alguns homens de ternos que me dão ascuo.

Exagero?

Pior é que não. Li não sei onde que 50% das mulheres são demitidas depois que voltam da licença maternidade. Que absurdo, minha gente! Como é que pode depor contra uma pessoa o fato de ela estar botando alguém no mundo com a missão de transformar essa infanto criatura em alguém com um caráter minimamente sociável? E talvez essa pessoinha vire mão de obra no futuro – tô usando esse termo horroroso que é pra ver se fica claro pra quem gerencia e demite outras pessoas 

É Ilógico, não?

Aliás, quase tudo no meio empresarial é ilógico. Trabalhar 11 meses para se ter apenas um, se tanto, pra gozar do dinheiro que acumulou. Trabalhar cinco dias da semana, ou cinco dias e meio, já que existem empresas que ainda comem metade do sábado do infeliz do funcionário, pra ter apenas um dia e meio para, finalmente, desfrutar do benefício do dinheiro da ralação de todos os dias.

Ufa! Cansei só de escrever.

Podem me chamar de vagabunda, preguiçosa, o que for, acho insano. Há muitos anos que acho um absurdo essa subserviência que temos ao dinheiro e ao trabalho. Acho trabalhar ótimo, mas não é ele que me dignifica. Quem me dignifica é meu caráter, minha ética, minha personalidade.

E eu não estou sozinha. Olha o que escreveu a @cacautells. Tá lá no sétimo parágrafo ela compactuando comigo.
 

Também não estou aqui falando que quem tá trabalhando está errado, a crítica é mais profunda, é ao sistema, e não ao indivíduo, ok?

Lembro-me de quando eu fazia parte desse sistema. Acordava às 7h, tomava café, tomava banho e a coitada da minha mãe tentava extrair de mim, já sem graça. algum diálogo, pois sabia que meu tempo era curto. A gente se despedia na porta e eu ia cantando ao entrar no elevador: “Todo dia ela faz tudo sempre igual…” Só Chico pra me render numa hora dessas. Às vezes eu ia de Almir Sater e entoava: “Ando devagar porque já tive pressa e levo esse sorriso porque já chorei demais…” E ia tocando em frente… Essa era  a minha meta de vida.

Gente, uma vez era o aniversário da mamãe – O ANIVERSÁRIO! -. Ela fez uma feijoada lá em casa. Tinham crianças, meus tios e algumas pessoas que não precisariam sair dali em menos de uma hora. Ai que inveja eu tive dessa gente minha! Comi correndo, cantei os parabéns ligeiro pra voltar pro trabalho. Deixei de curtir aquela tarde deliciosa porque tinha de preencher uma planilha de Excel. Oh! Mudei o mundo por casa disso.

Mas devo dizer em meu favor que, certa vez, dei uma “esticada” numa dor de ouvido, que era real, e me mandei pra Jericoacoara com a minha família inteira. Éramos uns cinquenta e eu me orgulho super de ter transgredido e ido criar memórias em vez de planilhas. Crianças, saiam da sala… Ou melhor, entrem. kkkkkk

Porém, eu não conseguia ver a luz no fim do túnel, não sabia como ganhar dinheiro sem me sujeitar aos achaques de uma empresa. Aconte que quando a gente muito deseja algo, ele acaba acontecendo e, graças ao cosmos, faz tempo que não sucumbo, pelo menos completamente, ao capitalismo selvagem.

Fico impressionada de o mundo evoluir e essa carga horária e todos esses clichés empresariais, como crachá, hora de entrar sem hora pra sair, vestir a camisa da empresa, treinamentos e dinâmicas de grupo, etc, etc etc, como é que isso não muda? Arg! Tem alguém feliz nesse esquema? Se sim, me deixe saber, pois ficarei até mais aliviada. Fico sempre pensando que todo mundo tá sofrendo.

Me compadeço do garçom trabalhando até de madrugada pra me servir, fico com pena de quem trabalha no Ntal, dia das mães e dia dos pais em shoppings, acho uó os shoppings abrirem aos domingos. Jesus amado, até tu descansou e o povo não?

Ora, as melhores coisas do mundo são: a casa da gente, os filhos da gente, os nossos. Daí que você é obrigada a passar a maior parte da sua vida acordada dentro de um escritório sob uma luz fria e tendo de ser simpática com estranhos. É pra essa vida que a gente nasceu? Não é possível que esse seja o “plano de Deus” para nós.

Pois bem, acontece que eu fui ajeitar o meu currículo e vi que ele precisava de várias outras correções. Não informarei meu estado civil e nem a quantidade de filhos – que eu não tenho – pois isso só diz respeito a mim. Vou acrescentar coisas que eu gosto de fazer e, lá no rodapé, vou dizer que sou a pessoa que mais cumpre prazos na vida, desde que eu possa enviar todos os projetos do sossego do meu lar.

Ah! E vou acrescentar que não sou anti-social, adoro reuniões nas empresas que duram duas horas e a gente sai de lá com um monte de coisas pra fazer – fora do escritório, por favor – e que, apesar de assustar, eu sou uma boa profissional.

Posso botar também que adoro praia, cerveja gelada e samba… Vocês acham que orna?

Espero que me contratem.

Amém.

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