Perdi.

Talvez eu nem tenha perdido tudo, mas eu sei que eu perdi muita coisa.

Esse 2018 me arrancou esperanças, inocências, fantasias… Botou meus pés no chão e bateu na minha cabeça pra enterrar um pouquinho mais.

Perdi.

Das lutas que travei, devo ter pedido quase todas, acho. Até essas de final de ano, quando a gente, num último suspiro tenta renovar a esperança pra fechar o ano bem, até essa batalha eu perdi. E olhe que nem entrou dezembro.

Perdi.

Acho que perdi o traquejo. Lidar, relacionar, me entregar, recuar, deixar a chuva passar, deixar o barco correr em outra direção… Acho até que eu perdi o jeito pra rimar… pra amar…

Peço o telefone? Chamo pra sair, digo pra ficar?

Sei lá, perdi o time.

Por mais que se diga que toda perda traz um ganho, que o não ocorrido não era mesmo pra acontecer, eu perdi. E perder é ruim, não se ganha nada com a perda, se perde, mesmo que depois você ganhe alguma coisa, esse ganho é outra coisa, àquela mesma você perdeu. E doeu.

Perdi o contato e o tato. Perdi gente, perdi papos, perdi sintonias e afinidades. Eu perdi amizades. Das piores perdas, essa. Perder amizade é perder lealdade. Perder lealdade é perder identidade.

E olhe que eu tentei. Tentei trilhar um caminho que me parecia lógico, colorido, daqueles que não machucavam a mim, nem a ninguém. Tentei abraçar, tentei me envolver, tentei estar, mas perdi as paradas, perdi o tom de voz, perdi os sussurros.

Eu perdi o rumo, eu precisei mudar os planos, recalcular rotas e me perdi completamente. Virginiana às avessas, todo o programado saiu do script, do signo, só a autocrítica mesmo.

Perder é desorganizador.

Perdi paragens, perdi sossego, perdi a saúde e dinheiro.

Perdi certezas. Aliás, o que mais perco são elas, acho. O que eu acho até bom, penso. Porque penso que a gente só anda se não estiver tão amarrada assim. Certeza é amarra.

Por incrível que pareça, eu aumentei a fé. No divino mesmo. Nisso que eu acho que não leva a lugar algum, que nem ajuda tanto, Essa, de alguma forma, teve que compensar todo o plano terrestre para meus dias deste ano.

Pior que ouvi um dia desses um compositor dizer que os melhores artistas são os ateus, porque a fé, de cara, já tolhe nossa criatividade, porque você, da largada, já tá pecando, já é temente… Realmente, uma pessoa desas não pode criar que preste com tanta castração assim. Eu mesma já devo ter perdido a minha vaga no céu.

Mais uma perda pra conta.

Se bem que, me lembrando aqui das minhas aulas de matemática, aquele monte de menos soma – menos é mais pra ser mais clara e cliché. Tô achando que no final – que eu não tenho a mínima ideia de quando, o que e onde seja este tal final, algo há de somar.

Porque se continuar assim, essa perda sem fim, não vou dizer que vou me perder de mim porque ficaria uma rima tão besta. Mas perder cansa.

A perda definha, entristece, a perda tira o brilho, a fome. Perdas deixam as pessoas amargas. Perdas nos deixam medrosas, exitantes. Perdas são exigentes, baixam imunidade. A perda adoece. A perda apodrece. A perda resseca, dilacera, queima (à roupa). A perda nos cala.

A perda é memória sem… Me esqueci. Perder é esquecer, quer dizer, perder é recalcar, o inconsciente armazena e “vezenquando” trás, a perda, toda disforme. A perda assusta.

A perda abre espaço.

E é aí o pulo do gato, é aqui que a gente não sucumbe, é nessa hora o rebote, o reverso, o ganho.

Não é ganhar, é poder trafegar, é poder rolar, é poder circular. Como reforma na casa, sai um móvel e fica nada e é nesse nada que se pode muito.

Perder é reciclar, é dar novo  formato, novo uso. Perder é redirecionar e redimensionar também, vai ver que o que se tinha nem era tanto assim. Perder é troca.

Cuidado, perder pode ser hábito.

Perder-se é reencontrar-se com uma pedaço seu que há tempos você perdeu. É resgatar o que se era antes de transformar-se em o que se esperava que fosse.

Perder pode ser livramento. Perder pode ser reinvenção, pode ser benção.

E no balanço das perdas, nessa eterna função do segundo grau, num logaritmo ilógico, em qualquer número vezes zero e dividido por zero, nessa conta que não fecha, na matemática elevada a milésima potência, quadrada, raiz, é daí que brotam palavras, daí que brota amor, daí que saem os números, que cessam as subtrações, é daí que Clarices, Machados e Vinícius nos redimem, nos entregam.

É da perda que vem o ganho.

E se você perdeu a sua crônica da semana passada, clica aqui.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *