Conversas e tempos de Instagram
Eu sei de tudo o que está acontecendo na vida dos meus. E também sei do que está acontecendo na vida de quem eu nem sei quem é.
Sei que os meus estão viajando a trabalho, estão na balada, na praia com os filhos no domingo, na praça. Sei o que comeram, as músicas que ouviram e na casa de quem que foi o regabofe. Sei a roupa que vestiram, se o marido foi ou não e sei também que elas amam seus maridos e esposas, são muito gratas à vida e adoram dias de sol. Mas quando chove, sei também que apreciam o momento e agradecem a Deus pela água abundante.
Sei que estão no Chile, na França, no Sítio do tio, na casa de praia. Sei que estão dando duro no trabalho, que estão viajando a trabalho e, por isso, também dão duro, porém se divertem, pois vem sempre acompanhado da #NóisTrabalhaMasSeDiverte. Sei de reencontros, de gravidez, de início de namoro e até do fim pois começam as selfies com frases de auto-ajuda, é batata.
Assim como eu sei da deles, eles também sabem da minha, pois, salvo algumas hashtags que não uso, também tô lá imprimindo a minha vida pra quem quiser ver. E a gente torce pra que o máximo possível de pessoas queriam ver.
Menina, o Instagram é o fim da fofoca.
Até aí tudo bem… Quer dizer, tudo bem nada porque essa mania nossa de ficar se amostrando pra umas quinhentas pessoas – ou muito mais – numa tentativa de demostrar pro mundo que o lugar que a gente tá é o melhor lugar pra se estar, ou tentando passar recado pra Fulano e Sicrano me parece tão irracional e ridícula que me assusta.
Me assusta mais ainda eu achar tudo isso e continuar lá. Ai não, pera, eu trabalho com internet e preciso continuar lá. E eu gosto de lá, mesmo sabendo que é um vício. Instagram, Whats app e Coca-cola são iguais a cigarro, crack e maconha, você não larga.
O problema não é bem esse, isso tá dado. Fico pensando se for confirmada a teoria de que existe algo além de nós, assim meio Matrix, controlando tudo, essa galera deve estar se divertindo com o novo brinquedinho que nos deram: a p!##$ do smartphone, o qual é smart, mas emburrece “nóis tudo”.
Emburrece porque estamos perdendo a capacidade de dialogar. Nem vou falar de se encontrar pra tomar um café porque isso é coisa do passado passadíssimo, do tempo de vovó, que botava cadeira na calçada. Tô falando de ligar mesmo, telefonar.
Já preveria Ítalo Calvino, lá na primeira metade do Séc XX, que as imagens substituiriam as palavras. Pois tá aí, Calvino, tu estavas pra lá de certo. Venha ver a primeira metade do século XXI a que ponto chegamos.
Pra que raios eu vou ligar para minha amiga pra saber do casamento que ela foi ontem, se vi fracionado de 15 em 15 segundos, o que ela fez na festa? Ora, Luciana, realmente, pra que é que tu ainda quer falar com alguém, a criatura num tá ali já falando pra todo mundo?
Muito retrô, eu.
Dia desses liguei pra uma prima, eu estava angustiada e queria desabafar, ela já tava dormindo e percebi uma voz cansada, achei melhor desligar, disse que mandaria uma áudio explicando o que era. Nem mandei. Ela também não me perguntou mais e ficamos por isso mesmo. Pelo menos sei que ela tá feliz e que estava muito bonita um dia desses e ia sair. Ah! Ela também tá viajando a trabalho.
Quanto mais nova a pessoa é, mais difícil o contato. Minha afilhada nem responde Whats app. Mas pelo menos eu sei que ela estava feliz tomando um vinho com as amigas… Nossa, como ela cresceu, meu Deus! Vinho é coisa de adulto. Ops, mas ela já é adulta, tem 20 anos. Caraca, deixa eu dar uma stalkeada no instagram dela pra ver esse tempo que achou de passar tão ligeiro.
Sem contar a pessoa que te reponde com carinha quando você faz uma pergunta… Se eu te pergunto: Você quer tomar vinho amanhã? E a pessoa te responde assim “:)”, você vai aparecer na casa dela ou não? Acode porque eu não sei.
O fim de mundo é minha mãe, que também não me liga mais. Segue nossa conversa, via whats app:
Eu (em áudio): – Mãe, tô sem crédito no telefone, quando ouvir essa mensagem me liga, só queria pedir a benção mesmo (nossa piadinha interna).
Ela (mais de uma hora depois, via mensagem de whats app): – Oi minha filha, to aqui com as crianças e só agora ouvi sua mensagem. Você já está abençoada. Bjs
Fim de papo.
E assim vamos seguindo essa vida, numa conversa truncada, criptografada e esvaziada do tom de voz ao pé do ouvido, da franqueza, das pausas, dos engasgos, dos sotaques… Vamos seguindo corajosos atrás de nossas telas. Falamos o que pensamos, já que o interlocutor não existe.
Pois bem, fim papo mesmo porque em eras de Instagram você não deve estar com muito tempo pra ler mais do que isso não. Melhor ver uma foto, né? Então segue o insta do Paris Só de Ida, vá la.
No meio do caminho tinha uma enxaqueca
Acorda, malha, volta, se arruma, pede um café com leite e ovos mexidos, liga a máquina, digita mil coisas, despacha vários e-mails…
Respostas de 5
Lu, concordo com o aproximar os distantes mas não afastar os próximos, depende de nós cultivar esses encontros com os mais proximos, que sempre que acontecem são maravilhosos. A vida mesmo que é tão corrida e não nos damos tempo pra se encontrar e botar o papo em dia pessoalmente.
“depende de nós cultivar esses encontros com os mais próximos, que sempre que acontecem são maravilhosos”. Eu também acho a coisa mais maravilhosa da vida :). Beijos!!!
Kkkkkkk não resisti, Lu, ri da resposta da sua mãe!
Concordo em parte com vc, quanto mais leio e quanto mais observo as pessoas, mais tenho a certeza de que o grande objetivo do ser humano é a autoafirmação. É querer ser admirado, valorizado, aprovado. O se “amostrar” nas redes sociais vai bem ao encontro dessa ideia. Isso as vezes reapresenta uma autoestima baixa e outra um egocentrismo enorme, varia de pessoa a pessoa… por outro lado, nesses tempos loucos em que fazemos mil coisas ao mesmo tempo, acho que não saberíamos da vida de ninguém se não houvesse as redes sociais e “saber da vida” não é só fofocar, é acompanhar, se sentir perto de pessoas queridas mas distantes, é curtir as vitórias. Acho que diminuíram as conversas pessoais sim, mas aumentou tantas outras aproximações, a exemplos dos grupos de família e amigos no WhatsApp. Grupos pequenos permitem muito mais troca de conversas pessoais do que se não existissem. E acho que as conversas mais íntimas sempre vão existir, pq o Instagram só mostra o que queremos mostrar a todos (ou não!), mas concordo com vc que essas conversas são cada vez mais escassas. Enfim, acho que há grandes perdas, mas há ganhos também, ótimo tema para nosso almoço, não?
Mi! Adoro vc aqui :).
Realmente as redes sociais aproxima os que estão longe, mas continuo achando que afasta os que estão perto. Às vezes tenho mais intimidade com apessoa via whats app, mas quando a vejo ao vivo, não temos tanto assunto… É engraçado isso. Mas enfim, certeza é papo para o nosso almoço 🙂
Também adoro estar aqui, às vezes demoro um pouco, mas quando volto leio todo o atrasado, rsrs!