Depois do fim

depois do fim

De onde ela escreve, tudo ainda é vazio, ou cheio da saudade da presença dele, o que é a mesma coisa.

O fim de uma história de amor é sempre uma tragédia. Uma morte precoce, um acidente de carro, um infarto. Falta tempo. Não teve nem tempo de dizer que conseguiu aquele contato que tanto buscava. Ele não terminou de contar a história daquela reunião. Há um silêncio devorador em todo fim. Tanto a ser dito, a ser sussurrado, a ser vivido pela milésima vez… Sempre igual, mas sempre diferente.

Morre-se um pouco ao fim de cada amor. Morrem os projetos, os planos e os sonhos. De uma hora pra outra, tudo é outra coisa, outro cenário, é devastação com muita poeira a ser espanada. Como casa posta abaixo, como ruína, feito depois de um terremoto.

Eles sabem, já se disseram, que virando à esquina existe vida, existe a chance de se reconectar com a vida. O passado ativando o futuro, como tem aprendido entre leituras e descaminhos.

Mas, por ora, o corpo ficou dopado. O que antes ardia, hoje busca se reintegrar desse despedaçado todo. Como se entrasse em posição fetal e pedisse colo, canto, útero. Dói o vento batendo, dói o cheiro que lembra porque dói o pensamento, dói a música que fora trilha sonora de tanto. Erraram por tanto amar (urgentemente).

Pode o amor matar uma história de amor?

Ao mesmo tempo, ela se pergunta como a humanidade pode viver com tanto desamor, “meu amor”, sendo a melhor notícia que se lê no dia é a alta de Wesley Safadão do hospital. Ela deseja saúde a Safadão, mas espera notícias boas do Brasil. Saúde pra si, pra eles dois, pra todo mundo… De corpo e de alma.

As frases são curtas porque não há mais fôlego. Perderam o ar em beijos sem tréguas e sete mil léguas sem descansar. Foram tanto que não sobram pro que a vida exigiria de quem ousa buscar a felicidade. A felicidade cobra um preço alto e o que a vida parece querer da gente é covardia e monotonia. Desorganizar a mobília, arrastar os móveis cansa e dá trabalho.

Pobre vida, os encontrou à revelia, à rebeldia: tentaram. Pobre deles que ousaram desafiar a vida. Não são todos os que vencem, mas os que conseguem dizem que vale toda a pena.

Às vezes, acuada, pensa que falar de amor é um ato de coragem, porque é uma fragilidade e por isso é um tabu. Devia ficar tudo silenciado, entalado, segurando o choro e adoecendo a gente. “Salvem os poetas que nos botam o dedo na garganta e nos colocam pra fora. Cantar “Evidências” berrando, sabe? E nessa loucura, de dizer que não te quero… Salve de Fernando Pessoa à José Augusto. Sem eles, sufocaríamos”. Pensa.

Olha rapidamente o site de notícias e vê que nós mulheres não estão a salvo nem nos centros cirúrgicos, nem nas UTIs. Estarrece-se, sente nojo, ódio e desalento. Confirma também que não se pode mais fazer um aniversário em paz. Desola-se e se desanima com a humanidade. Talvez nos matem porque o tema que devia ser da Xuxa foi da Angélica, ou da Mara Maravilha. Vai saber o que move cada um.

Desiste de ler as notícias, como se assim pudesse fingir, por um instante, que o mundo é bom. Por hoje, por um átimo, quer o egoísmo dessa dor, quer uma suspensão, um entrelugar num “espaçotempo” para ser o tanto que restou de si depois do fim. Só por hoje.

Amanhã é outra via, o dia depois. Talvez acorde mais cansada que sozinha. Como um corpo pós vacina, como depois de um vacilo.

Talvez já seja tarde demais para esquecer. Talvez seus caminhos se tornem esquinas onde num cruzamento, numa encruzilhada, num deslize, ela possa esbarrar com ele novamente, num tempo da delicadeza, onde nada digam e sigam encantados lado a lado. Quando o que sentirem forem sinônimos: de amor, de amar.

O que ela queria? Pode voltar para aquele final de semana. Mas o corpo não se move.

Por ora, melhor não ler tantas notícias. Melhor olhar pro mar. Melhor não ligar a TV.

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