Deus conceito

deus conceito

Para mim, caiu a ficha. Deus, a meu entender, não é uma pessoa que morreu, não é um mistério, não é mais uma ficção, não é mais endeusado e nem demonizado. Deus, para mim, é um conceito.

Dia desses meu sobrinho, que super crê em Deus – e eu acho muito fofo – me perguntou se eu acreditava em Deus enquanto caminhávamos pela coisa linda que é o Rio de Janeiro e, ao olharmos para cima, vimos a estátua do Cristo Redentor que é de arrebatar até quem não crê.

Na hora, não quis dizer que eu não acreditava, não queria que ele perdesse o seu encanto, então, fui falando o que me vinha no coração, que é de onde saem minhas palavras sempre que me dirijo ao nelsinho. Falei pra ele que Deus, para mim, era a bondade que morava em cada um de nós.

Passados os dias, uma amiga de família ateia disse que seu pai lhe dizia, quando ela era pequena e o perguntava sobre a existência de Deus, que Ele existia no tempo, por exemplo. O tempo que faz um bicho nascer e se transformar na perfeição que é, como um cão, um leão, uma abelha… Assim ele dizia o que pensava sem que ela perdesse o encanto do mistério que permeia a nossa infância.

Filosofando com os meus botões, comecei a pensar que Deus pode ser um conceito e isso já é a coisa mais linda do mundo. Desse modo, sendo Deus uma ideia, uma forma de pensar, de agir, Deus se torna muito mais Deus no sentido em que ele se desobriga, por exemplo, de ser bom o tempo todo.

Ora, se eu pensar nos países da África, ou mesmo na miséria e na violência das ruas e dos rincões do Brasil, vejo que Deus não é bom o tempo todo, coitado, nem poderia. Não consigo imaginar um ser superior que designe a sorte ou o azar das pessoas. Também não consigo imaginar algum deus em uma central de controle da Terra que diga o dia, a hora e a forma que as pessoas morrerão. Não consigo imaginar Deus escolhendo uma criança para morrer de câncer, por exemplo. Ele jamais, faria um negócio desses.

Aí você pode me perguntar sobre a religião. Qual seria a função dela?

Nessa minha filosofia de pote que não interessa a ninguém, só a mim mesma e talvez a alguns corações aflitos com a descrença em algo superior que possa nos confortar, penso que a religião tem a sua função social na organização do ser humano na Terra. Por vezes, a religião pode ser bem desorganizadora e em nome dela uma população inteira viver em guerra. O que só afirma a função social da religião.

Tirando os extremismos, a religião tem a função de acalmar, de agregar, de sensibilizar, de acolher as pessoas e isso é, sim, bonito demais. Os valores de bondade pregados pelas religiões sérias podem ser extremamente organizadores e não castradores, permitindo que cada membro da igreja tenha a sua liberdade de pensamento, mas que baseie a vida em valores cristãos, que são os de bondade e de amor ao próximo.

As religiões, portanto, com sua função social fundamentadas no conceito que é Deus, a meu ver – veja bem, isso é uma mera opinião minha, respeito inteiramente a sua, mesmo sem concordar – são capazes de nos erguer em pilares positivos para a que a nossa vida seja boa por aqui, neste plano, sem pensar em outro.

Nem Deus e nem a religião deveriam ser vetores de alienação. Quando vejo um adesivo em um carro escrito “Foi Deus quem me deu”, me dá uma raiva. Fico com vontade de descer lá e perguntar por que ele mereceu um carro de Deus e o colega só anda num ônibus lotado. Deus privilegia alguns filhos, é isso?

Mas onde estaria este Deus conceito?

Deus estaria no tempo – como disse o pai de minha amiga – que tece a natureza com perfeição. Deus estaria na esperança, que nos faz acreditar na cura, em um projeto, em uma vitória. Deus estaria na sabedoria de uma resiliência, quando precisássemos entender que aquela batalha foi perdida, que a vida não é justa muitas vezes e que nos cabe recomeçar de outro ponto. Deus estaria no nascimento e na morte nos mostrando que a vida tem início, meio e fim e que o fato de termos tido a sorte de nos tornarmos pessoas já é benção suficiente. Deus estaria no sorriso de uma criança e no conselho de um velho. Deus estaria naquela manhã cedinho de frente para um mar calmo e você tendo a certeza de que aquilo é uma amostra do paraíso. Deus estaria no Rio de Janeiro e em Paris ao mesmo tempo, para pessoas distintas ou para a mesma pessoa, no caso, eu. Deus em dúvida estaria no meu pai, na minha mãe e na minha tia Eliana. Deus estaria num gesto de afeto; num abraço em silêncio, mas cheio de ternura; Deus estaria na capacidade do ser humano em produzir beleza, seja na música, na pintura, na literatura, na dança. Deus estaria no Chico Buarque e na Maria Bethânia (que é um entidade, ela, já deve ter desencarnado e deixou essa energia toda aqui).. Deus estaria num cheiro que te lembre sua avó que já morreu. Deus estaria na empatia…

Num Deus conceito não é preciso crer, mas vivê-lo, internalizá-lo e percebê-lo. Não precisaríamos temê-lo. Medo a gente tem que ter da lei dos homens que é pra gente não dirigir alcoolizado, por exemplo, e nem andar armado por aí matando as pessoas ao menor sentimento de raiva.

Fundei em mim essa religião que nem sei se eu mesma tenho muita fé. Também nem sei se ela já é exercida em algum lugar. Acho que o budismo passar por aí… Mas minha crença é no terreno e minha preocupação é com o que e com quem está aqui. Fiar meu pensamento no sobrenatural não me convence.

Mas não brigo mais com Deus. Nem vou ficar questionando sua existências e as injustiças desse mundo não vou despejar em cima dele. Sigo achando que já é divino o suficiente estar viva, habitar esse mundo e sentir essa brisa que está soprando agora enquanto eu escrevo estas palavras. Por tudo isso eu sou grata. Amém!

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2 respostas

  1. Nunca pensei Nele dessa forma. Muito menos, pensei que Ele pudesse estar em mim. Mas o fato Dele ser visto das mais diversas formas mostra que o importante é sabermos que podemos vê- lo sempre que quisermos e na forma que queremos e isso sempre trará um conforto. Linda crônica! Muita coisa para refletir.

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