Não é porque eu não escrevi que eu não vi

não é porque que não escrevi que eu não vi

Você que me acompanha aqui, que me lê com regularidade – se é que você existe, mas tomara que você exista porque eu também escrevo por achar que você existe – você deve estar achando, com razão, que eu ando alienada, meio fútil até, alheia aos acontecimentos políticos, sociais e culturais que acontecem, acometem, assolam, ou “vezenquando” salvam o país.

Dei pra escrever sobre a felicidade, ora, veja se isto é possível. É possível, eu sei, há motivos pra comemorar. Aliás, há um motivo específico para comemorar e o nome dele é VACINA. É ela, é só por causa dela que depois dos anos de 2020 e 2021 há motivo para celebrar alguma coisa, desde “confras” de final de ano até abertura de fronteiras, a única vedete é a vacina.

É, isso mesmo que você pensou foi o que eu pensei e escrevi de propósito: Nossa! Que celebração soberba! Será que a Luciana não vê que só quem tá organizando “confras” de Natal é quem tem o que botar na mesa? Que tem gente que anda roendo o osso, literalmente, para ter o que comer? Que têm famílias e famílias dormindo nas ruas, cada vez mais? Que até hoje a gente não sabe nem quem mandou matar a Marielle Franco – a gente desconfia, né? – e que o caso das rachadinhas do zero qualquer coisa filho do presidente está sendo, no bom português, embaçado pra enganar os bestas, no caso, nós? Que nessa semana surgiu mais uma variante, a Ômicron e que nossos semelhantes da África, do continente todo, sofrem com, além de tudo, a falta de vacinas? Que chacinaram jovens, negros – claro – no Rio de Janeiro e que a mídia “apelida” todo mundo de bandido e tem gente que sente um alívio danado quando “esse povo” morre? A lista é sem fim, e eu dei pra falar de felicidade, como pode?

Passou o dia da consciência negra, não me passou batido o dia 20/11, mas o máximo que eu consegui fazer foi um repost do jornal O Povo no meu Intagram. Tudo isso de ruim passa todo santo dia e não me passa batido, mas eu devo confessar que eu dei uma desanimada temporária.

É que, gente, dá um desânimo! A gente lê, reflete, discute, estuda, vê, ouve, pesquisa… e ainda tem que ouvir muita gente dizendo que o mundo tá muito chato, que não pode mais fazer piada com nada, que não pode mais vestir isso, dizer aquilo. A gente tem que ouvir que essas feministas que vão pras ruas são tudo mulher mal amada, feia e sapatão – sim, gente, eu ouço essas coisas, e isso me dói. Ouço que é um desrespeito um casal gay se beijar em público, ouço as pessoas se incomodarem com a cor da roupa do menino e da menina, ouço muitas vezes as pessoas saírem em defesa do presidente da república e pior, o pior de tudo, o que me fez calar e adoecer, ouço a desgraça do presidente da república.

Por questão de sanidade e saúde mental, eu parei de me aprofundar por um tempo, tentei criar uma capa, mesmo me deparando todo o santo dia que deus dá com uma ruma de gente me pedindo de fralda pra família, à remédio, à comida. E ainda ouço pessoas que dizem que essas pessoas que pedem são malandras, que não querem trabalhar, etc, aí eu tenho vontade de falar das condições de trabalho, da miséria do salário, etc, etc, mas eu me calo porque a impressão que me dá é que tô sempre tendo que voltar trinta casas no quesito “progresso”. Não, calma, não vou mergulhar hoje no que considero progresso, se não eu não paro de escrever e você vai se cansar de me ler. Deixa pra outro dia.

Parei de me aprofundar pra ver se dava uma apaziguada aqui dentro. Dois anos de pandemia gerida pelo Bolsonaro foi muito pesado pro meu psicológico, minha analista que o diga. Não negar essa doença requereu de nós muito sangue frio, porque a situação foi desesperadora. No início, eu ainda aguerrida de minha vida pregressa, falei, escrevi, até me vesti de verde e amarelo (veja aqui). Mas depois, depois de tanto tempo, depois da vacina, depois de tanta coisa ruim e gente ruim no poder, e depois de, apesar de tudo, a vacina ter chegado ao meu braço e eu poder ter certa liberdade, eu recuei, me calei de cansaço e fui tentar recuperar a vitalidade na minha vida.

Mas não é porque eu não escrevi que eu não vi!

Agora, apesar de uma gripe horrorosa, que não é Covid, mas é forte, eu já me sinto mais forte pra poder encarar de frente o que o 2022 vai exigir da gente. Eu me dei conta também que a forma que eu escolhi de enxergar o mundo tá longe de me trazer felicidade, mas é a única que considero possível. O que não significa, claro, que eu seja uma pessoa infeliz, maaaas que compromete a minha felicidade, isso compromete. Mas é a forma que eu acho bonito estar no mundo, é a forma que eu penso que a gente consegue se relacionar, se conectar, arrancar um sorriso, ou uma esperança e isso, de alguma forma, volta pra gente.

Daqui pra frente, pretendo estar com a pena em punho pra descer o sarrafo e pra elogiar também. Política, amor, história, literatura, cultura, raiva, mágoa, paixão, ódio… Vai tudo voltar a passar por aqui. Eu devo voltar a ser eu mesma. Vamos juntxs?

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