O amor.
Reconheci que ela era dele só pelo jeito de não tocá-lo.
Entraram no metrô em três, dois seriam o casal e a terceira uma amiga. Teoricamente, não dava pra saber quem dali formava uma dupla, estavam equidistantes, mas de cara vi que ela era dele.
Só pelo jeito de não tocá-lo, mas de estar cem por cento à vontade com seus braços cruzados, falante, parecia argumentar sobre algo sério.
A amiga, que se dava bem com o casal, era parte ativa no assunto, mas existem trejeitos no oco, no ócio, no eco, que denunciam na hora quando uma alma é da outra.
A intimidade dos dois podia se dar pelo cheiro, pela vibração dos corpos perto, por um olhar, por um não olhar, por um deixar que ela fale sem parar, por um “estou aqui perto”… No amor, os códigos que o decodificam e o justificam podem ser imperceptíveis ao olhar cotidiano, mas basta parar um pouquinho pra reparar, ele está ali.
Bastou um solavanco do metrô pra ela se agarrar na cintura dele com a propriedade de quem é dona, de quem pertence àquele colo, àquele acolhimento, àquele abraço. A segurança de quem tem um parceiro, um porto seguro, alguém pra chamar de seu e dizer que é sua.
Alguém pra quem baixamos a guarda, pra quem somos nós mesmos, sem reservas, sem vergonhas, sem medo. Alguém que é mais íntimo de nós do que nós mesmas, sempre tão críticas e estranhas quado encaramos o espelho. Alguém para quem se aparece sem maquiagem, com roupa puída, sem escovar os dentes. Alguém com quem se divide a mesa, o mesmo banheiro, a cama, a vida.
Podemos até nos afastar de nós mesmas, mas do nosso amor não. Ele fica, ele sempre fica, ele sempre está, ainda que seja numa lembrança, numa saudade, numa história que não foi.
O amor é onipresente e não se limita a tempo, e espaço. Sobrevive às mais adversas condições de pressão e temperatura.
O amor é amor e ponto
Eu tinha certeza de que ela era dele e nem foi a aliança de ouro em meio aos anéis de michelim que denunciou. Nem foram os códigos básicos de casaizinhos que se chamam de mozi, mozão, meu filho, meu bem, coração, etc.
Não são os rótulos que evidenciam o amor, não são os símbolos e os rituais que o legitimam, não são as flores, as viagens e os presentes que o faz durar uma vida. Nem precisa durar uma vida, o amor.
O amor é evidente quando é correspondido. Ele ganha identidade própria só que com duas digitais e apenas duas. Ele aparece no semblante, transborda num olhar, no encaixe daqueles corpos ainda que estejam distantes.
É, amor…
Ah! O amor.
ainda estou aqui
Ainda estamos aqui
… Lembro-me de que quando li o livro, tive a sensação de estar lendo algo sobre meu passado, sobre uma história muito difícil, sofrida, mas passada…
Uma resposta
“Alguém que é mais íntimo de nós do que nós mesmas”… melhor definição!!!