Pai, o que passa mais rápido: o carro, ou o tempo?

O carro, ou o tempo?

Pai, o que passa mais rápido: o carro, ou o tempo?

Perguntou a minha sobrinha de seis anos para o meu primo, que ainda está devendo pra ela a resposta.

Aqui, minha querida Alice, a tia Lu vai tentar filosofar algumas respostas, mas já vou adiantando que nenhuma delas estará à altura da genialidade da sua pergunta.

Na verdade, meu amor, a sua pergunta não tem resposta porque ela não é da ordem das coisas concretas, mundanas e rasas. Sua pergunta deveria ter sido feito a Platão, a Nietsche, ou a outra criança como você, porque só as crianças possuem essa genialidade pura, sensível. Nós adultos, a gente leva tanta bordoada da vida que vamos colocando camadas de rancor, de dor, de mágoa em cima de nós, e os psicólogos vão dizer que tudo isso gera aprendizado e que isso é bom porque a vida é assim mesmo e nós estamos aqui para aprender a lidar com as adversidades.

Mas bom mesmo seria se a gente não precisasse ir calejando a nossa sensibilidade pro mundo para termos de nos defender de outros seres humanos também calejados por mágoas, rancores, frustrações e decepções.

É complexo, né, minha linda? Mas é porque a sua pergunta exige uma reflexão e principalmente um mergulho em nossas camadas mais grosseiras para chegar lá no sensível que me habita pra alcançar a criança que mora em mim porque, aqui é uma boa notícia!, a nossa criança nunca deixa de habitar a gente, com suas alegrias e medos também.

Mas vamos lá! Quem é mais rápido: o carro, ou o tempo?

O tempo. O tempo que correu e sem que eu percebesse você deixou de ser aquela bolota de olho azul para ser essa menina alta, inteligente, curiosa, interessante e linda, já passando e muito da minha cintura.

Quem é mais rápido?

O carro, que cruza um sinal vermelho sem que haja tempo de ninguém avisar que uma senhora atravessaria a rua, o que viria outro carro mais rápido do que o tempo da vida e colidiria com o carro em que estavam os nossos primos Flávio e Ana Karina.

O carro, ou o tempo?

O tempo, que dura um segundo naquela viagem maravilhosa de carro, com dia de sol, banho de cachoeira, primos e, quando a gente vê, já anoiteceu e é hora de voltar pra casa.

Mas o carro pode ser bem mais rápido quando, numa corrida contra o tempo, igual ao tio Gustavo correu com seu pai que estava com alergia ao camarão da festa. Tio Gustavo, que adora Fórmula 1, voou baixo pro hospital a tempo de seu pai ser atendido e ficar ótimo.

O tempo e o carro podem andar na mesma velocidade em uma tarde bonita, num passeio à beira mar com quem a gente ama. Você vai ver como é legal. Podem andar juntos quando aprendemos que a pressa gera uma ansiedade que é a maior perda de tempo e de qualidade de vida e, assim, somos mais prudentes no trânsito, em tudo.

Só que o tempo, ele só segue em frente. O carro pode ir e voltar mil vezes. O tempo, ele passa todo dia no mesmo tempo. O carro, você pode escolher perder uma carona pra gastar seu tempo de preguiça na cama. O tempo, meu amor, ele é seu e você vai andar por ele como quem pega um carro e segue vida afora, ele é uma chance, uma viagem. Torço pra que seu tempo seja lindo.

Quanto ao carro, quando você tiver o seu, você me dá uma carona pra eu poder desfrutar do meu tempo ao lado dessa sobrinha tão incrível que eu tenho?

Te amo,

Tia Lu

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