Pênaltis

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Pênaltis:

Há pelo menos duas semanas que eu estou em suspensão. Aliás, há pelo menos dois meses que ando assim, mas as duas últimas semanas foram mais.

Dias que não sei que dia é, que toda hora preciso me concentrar pra saber se segunda ou se sábado e mais ainda, que horas são. Como se tudo fosse uma coisa só e essa coisa toda fosse uma espera.

Meu ano de 2019 foi todo dedicado ao 2020. Passei um ano trabalhando em um projeto de tese para o doutorado que se iniciaria neste ano agora. Assisti aulas no Rio de Janeiro no início do ano para conhecer os professores e as linhas de pesquisa. Depois, mergulhei de cabeça no projeto que me tomava horas e horas de leitura, pesquisa e escrita. Sim, eu amava. Eu tinha até uma padaria preferida na qual os garçons já me atendiam falando: – O de sempre?, de lá, dessa padaria rotineira, saíram algumas inspirações de crônicas decorrente das conversas que eu escutava das vozes alteradas alardeadas de mesas vizinhas, ou dos casais nos quais eu reparava enquanto estudava, comia, ouvia música… Tempo bom. Cheio de incertezas, com algumas surpresas… Hoje vejo que foi bom. Depois começaram as seleções e nessa “brincadeira” foram umas sete provas e três entrevistas, já que eu apliquei para três faculdades, mas apostava as minhas fichas unicamente em uma, na que eu mais queria.

No fim, terminei a corrida em 15ª colocada, sendo que só tinha 14 vagas. A partir daí começou a minha espera e o meu estado de suspensão: Será que alguém vai desistir?

– Você só vai saber no dia 20 de Fevereiro, disse-me o secretário da área postergando para o ano seguinte o final do meu tão sofrido 2019.

Voltei pra Fortaleza e desde então eu só espero. Primeiro esperei o dia 12/01, pois teria uma pré-matrícula. Sim, todos se matricularam e o mesmo secretário me disse que seria muito difícil uma desistência. Esperei, então, do dia 12/01 ao 20/02 como quem tá num limbo. Não consegui resolver nada, assumir nenhum compromisso, nem tocar a vida adiante, pois não sabia se meu 2020 seria em Fortaleza, no Rio de Janeiro ou sei lá mais aonde que a vida achasse de me arrastar e eu fosse. Esperei.

Dia 20 finalmente chegou não sem levar, claro, toda minha imunidade devido ao estresse e me deixar doente por quase 15 dias, já. Liguei pra faculdade e, entre informações desencontradas, descobri que teria de esperar até o dia 27/02 pra saber a resposta. Esperei deitada, já que estava super doente e nem o carnaval eu pude pular.

Dia 27 chegou e… Sim, há uma vaga, há a sua vaga – a minha, no caso – só que ela está bloqueada porque a pessoa que desistiu fez o favor de desistir no dia seguinte que fez a matrícula e o sistema encerrou o processo. Espera.

– Me liga no dia 2/03, à tarde – veja bem, só à tarde -, pois vou tentar reverter isso já que a sua vaga existe, mas o sistema está bloqueado.

Chequei no calendário e hoje é domingo, dia 1/03 e, como tá escuro, sei que é noite e é de quando eu escrevo esta crônica. Preciso dormir, acordar, fazer duas refeições – que sorte a minha de poder fazê-las – para saber se vou passar o 2020 fazendo o meu tão desejado doutorado no Rio, ou terei de me haver com o que fazer em Fortaleza. Veja bem, nessa tortura da espera eu perdi a esperança mil vezes e já tentei botar a cabeça em ordem e planejar o ano outras mil e não saio do canto porque eu, infelizmente, estou sendo forçada a fazer o que um ansioso tem fobia na vida: esperar.

Só vou publicar essa crônica se eu tiver finalmente conseguindo vencer um sistema burocrático, um computador, um código binário e minha vaga tiver sido reaberta e eu talvez já esteja até no Rio de Janeiro dentro de sala de aula quando você estiver me lendo.

Eu tomara, porque, sinceramente, eu não aguento mais tanta prorrogação, já estou nos pênaltis esperando pra ver se sai meu gol. Não aguento mais esperar esse jogo acabar pra eu poder voltar desse lugar sem hora, sem destino, sem esperança, esse banco de reservas onde o jogador fica louco pra ser convocado, chutar a bola e decidir… Esse lugar de espera.

Quanto a você, obrigada pela paciência de ler este relato e ter esperado pra chegar até o fim sem nenhuma mensagem edificante ou arrebatadora até porque, de onde estou, não tenho a menor condição de aconselhar ninguém. “Dar tempo ao tempo”, “O que for melhor pra você é o que vai acontecer” são as piores frases pra se ouvir nessas horas, mesmo eu sabendo que as pessoas falam com todo carinho.

Valeu mesmo pela paciência, eu espero que minha espera – e nem a sua – tenha sido em vão.

Ps: Hoje é segunda-feira e às 08h:35 da manhã a minha vaga saiu :)))))))))!

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Respostas de 2

  1. Parabéns e bom proveito. Crescimento intelectual acadêmico nos valida diante de nossas angustias.

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